quinta-feira, 27 de julho de 2017

Desmistificando o aikidô - Parte 2

Recentemente fui convidado para ministrar um workshop na faculdade Estácio/CEUT em Teresina(Piauí/Brasil).  Dentre os temas solicitados me foi pedido para falar sobre a filosofia do aikidô.

Sempre considerei a filosofia a arte de quem não sabe fazer nada. A habilidade de sobreviver sem ter nenhuma habilidade. Coisa de vagabundo. Até começar a pesquisar sobre o assunto como preparação para o evento. Qual não foi a minha surpresa ao descobrir que minha vida sempre foi pautada pela filosofia e que eu mesmo sou esse vagabundo. Foi pela filosofia que decidi pelo aikidô e até a minha profissão.

Quando comecei a praticar, lá em 1992, havia uma pergunta na ficha de inscrição da academia sobre o motivo da minha inscrição. Por que eu queria fazer aikidô? Essa pergunta me perseguiu e sempre me incomodou. Não respondi. O estoicismo tem a resposta. Platão também em seu mito da caverna. Ou não.

Na verdade talvez essa seja a grande pergunta: por que treinar aikidô?(veja meu artigo anterior) por que treinar uma arte marcial?

A filosofia propõe uma profunda reflexão sobre "o que é". Os grandes pensadores, tanto do ocidente quanto do oriente, buscaram elaborar bem essa pergunta. Mas não só num aspecto contemplativo, ficar sentado meditando. Os estoicos(assim como Platão) tinham uma proposta prática. A filosofia deve ser aplicada na vida, no seu dia a dia. E para isso criaram os exercícios espirituais(Pierre Hadot). O estoicismo define a filosofia como a arte de viver bem. Uma arte que busca uma profunda conversão na alma e no modo de vida. Alguma semelhança com as mensagens de O'Sensei?

Estes exercícios espirituais, que não estão necessariamente associados à religião(ainda que a igreja católica tenha bebido dessa fonte), se referem à prática diária dos princípios da filosofia: o fortalecimento do corpo e consequentemente da alma, a disciplina, a visualização do negativo, a paciência e o foco no momento presente, respeito próprio e pelos outros e controle sobre suas emoções. E o aikidô pode ser a ferramenta perfeita para executar estes exercícios. Alguns desses aspectos eu já havia escrito quando falei das diversidades, da desmistificação do aikido em outro texto ou na tradução de sobre o que é um bom dojo.

Baseado no que disse Platão, a arte marcial não deveria servir apenas para o desenvolvimento de habilidades físicas, mas na transformação do praticante em uma pessoa melhor para a sociedade. Ao adquirir essas virtudes, e você irá adquiri-las seja de forma consciente ou não, em maior ou menor grau, você torna-se essa pessoa. Por isso, toda vez que você entrar no dojo lembra-te que aquilo que você irá fazer é uma lição de vida. Ainda que inicialmente sejam apenas sombras, liberte-se e vá em busca da fonte, busque a luz que gera essas sombras. Aí você se tornará um bom lutador, um bom artista marcial, um bom budoca, uma boa pessoa. Aí todo o seu treino e dedicação terão valido a pena.